terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Andanças sem andar.


É que tem dias que o palhaço fica assim ao céu, sem teto na cabeça, sem casca nenhuma que lhe faça um pouco mais forte. Se fosse no palco, ele diria que estava um super herói sem capas. Mas piada assim, cá pra nós, não tem graça alguma. Tem coisa mais triste que um palhaço triste? Depois do espetáculo, na rua e sem platéia, a dor escorreu pelos olhos, borrando a maquiagem roxa. A vaia veio de si, ou de partes que lhe compunham. Cada aplauso fora uma vaia que lhe arrebentava as costelas? A lua tem mania de dar o tom de azul às coisas. Lembrou-se então de outras memórias, cobertas pela mesma luz: como era belo o blue daquela pele gélida na madrugada. Blue. Blues. Para acompanhar o choro, uma canção. Como doem as lembranças! E como corroem as incertezas! Não bastasse a zombaria dos outros revirando suas víceras, agora o que lhe restava eram chacotas, deboches de si ou de partes de si para si mesmo. Num cansaço enorme, desabou no picadeiro, teve vontade de abandonar a corda. Mas apagou as luzes e foi pela noite feito coruja pensando o que faria agora sem lar. Ao léu. à lua. Enquanto sua vida envelhecia.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Flor no lixo.



A beleza é ingrata. Ou são os olhos de quem vê? O que é belo é relativo. O que depende, deixa de ser, para parecer. Aparecer? Não. O que é belo pode ser distorcido da beleza na tentativa. Para embelezar-se, esforça-se, espreme-se e o toque final é dado por um sorriso. Mas a beleza é mesmo ingrata. Velhice. Rugas. Curvas. A flor cansou-se de ser bela. E murchou.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Quando se perde um grande amor ...


No primeiro dia uma anestesia te toma, uma dormência de alma e corpo que deixa a vista e os sentimentos embaralhados como se tudo e nada fossem a mesma coisa e ambos completamente possíevis. O segundo dia amanhece sem oxigênio e a cada passo parece existir um cinto comprimindo aos poucos sua caixa toráxica. E essa coisa gradativa lembra a eternidade, e nada pior que perceber que a eternidade agora será vivida assim, só você e o tal cinto. Ah se você der a sorte de chorar... Eu desejo que você chore, pelo menos assim as lágrimas escorrem-se, te desinxam, a cintura fica um pouco mais frouxa. Senão, o esmagamento é inevitável. E por fim, o terceiro dia... a Bíblia fala que é o dia da confirmação, o prazo final para tudo, a última chance de voltar atrás. Daí falta todo o ar, o cinto espreme as víceras, as vistas e os sentimentos. A quietude é assustadora, todo silêncio de arrepia a alma e num desgosto de apatia, o corpo rui e a alma desmancha. Uma semana, duas, três... e então imagino que uma experiência de quase morte te torture e nenhuma realidae é capaz de ocupar seu tempo, que terás de viver sozinho. Os velhos sonhos faziam sentimento e querer à vida, sem eles não haveria como imaginar-se. Um novo ser, desencarnado, impassível. Insoso. Escuro.

Por sorte os pés se encaixavam ainda e de novo. Novo. E qualquer posição que os corpos se jogam é feita da completude que convida ao sono. Um sono gostoso demais. Sono quente de paz.


Abri os olhos e o suor que me esscorria pela testa era apenas o calor daquele quarto repleto de amor. Era só um pesadelo.

- Bom dia, amor!

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Minha omissão.


Os olhos vagueavam, de um lado para o outro, passavam pelo filme, pelo escuro, pelo mofo das paredes e caíam por fim dentro de mim, no abismo das lembranças. Eu não sabia o que fazer, onde me esconder ou se era para me mostrar. Quando estava me arrumando o Nando me alertara, havia sempre alguma chance do impossível rolar. O ceticismo não me deixou acreditar, até pagar para ver. E vi, como uma cena estranha de milagre. Agora não sabia nem onde botar as mãos, em que tom respirar para não demonstrar o pavor daquele impossível rolando aos meus olhos. À Deus devotei o deslumbramento das coisas imprevisíveis, e a permissão para que milagres como esses acontecessem. O cheiro era o mesmo, e o abraço exato e humano, dosado, apertado, delicioso. Eu estava com saudade, e meu mundo precisava dessa paz. Não há lugar melhor que a raiz de uma árvore.