quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Très triste.


Certo dia eu tinha dez anos, e em mais uma de minhas manhã comuns, eu estava assistindo desenho. De repente, a programação foi interrompida por aquele toque aterrorizante que dizia: o mundo está de plantão. Eu não entendia muito bem o que era aquilo, mas lembro que duas torres gêmeas e belas despencavam, escandalizando meus olhos de menina. Foi um avião que as derrubou, por querer de alguém que acreditava que aquilo deveria ser destruído.
E hoje estava eu, em uma mesma manhã quente e comum de minha semana, quando me conectei às notícias e lá estava ela: 12 pessoas foram mortas porque alguém achou que aquilo deveria ser destruído. O terror ficou comum, já são milhares de casos pelo mundo, e na maioria das vezes já nem nos incomodam mais. E não vamos muito longe, tem aquele garoto da periferia que perdeu a vida por causa de 11 reais. Alguém achou que ele deveria ser destruído.
O mais engraçado é que sempre colocamos estes crimes contra a humanidade numa distância galática de nossa realidade: mas não foi comigo. Se fosse, doeria diferente. 
Não percebemos que todos os dias, sutis atentados terroristas despencam na nossa janela.
Mais tarde, deste mesmo dia, eu estava na Igreja e, mais uma vez, estava tudo indo muito bem, até que o líder soltou esta palavra: 
"- Este era padre, chegou a ir para o seminário. Ele era seminarista, mas Deus o salvou." E agora ele se tornou pastor desta igreja.
Eca. Me dá nojo e asco esta hipocrisia. A denominação terrorista, no século XXI, quer dizer: aquele que vai contra os costumes do ocidente, está quase se transformando em sinônimo de anticristo. Mas, na verdade, o terrorista é aquele que causa o terror.
Me diz qual é a diferença do pensamento dos dois caras que atacaram a revista de humor na França hoje e o líder desta igreja que teve a infelicidade de dar aquele discurso? Nenhuma. Veja você, terroristas orientais e ocidentais se beijando.
Eu causo terror quando berro com o outro, agrido gratuitamente os que me rodeiam, deixo de ser generoso, e destruo com palavras ou atos os sonhos de um ser que vive. Sou terrorista quando sou gay e discrimino o hétero, ou quando sou hétero e odeio gays. Quando sou budista e odeio cristão, quando sou islâmico e odeio cristão, quando sou cristão e odeio todo o resto.Vida interrompida. E morremos diariamente, diversas vezes, e nem nos damos conta. Sim, John Coffee, eles se matam todos os dias e usam o amor para isso.
Tudo é um grande reflexo da grande onda de intolerância que toma conta do mundo. Seres quadrados vagam por aí, diminuindo suas mentes a cada dia, perdidos em sua ansiedade desvairada e escondendo-se atrás de telas e vidros. Evitam o toque, a compaixão, sentir com o outro. Eu me recuso em acreditar em qualquer ideologia de teto de vidro, disfarçada em máscaras da falsa perfeição e superioridade. Para mim não há terror maior do que discriminar o outro porque é diferente daquilo que eu sou. Porra, se todos soubessem o valor de uma identidade e a aprendizagem da diversidade... Confesso que meu maior delírio, utopia é de que todos se respeitem e derramem afeto por serem apenas o que são.
E assim continua a viver a humanidade, mergulhada em suas ilusões, pregando um amor que não pratica e querendo impor verdades absolutas.
Eu sinto muito pelos meus amigos franceses e por todos aqueles que são assassinados todos os dias por pessoas que se veem grandes, mas são muito pequenas. 
Mais uma vez estou triste. Mas dessa vez desejo ao mundo, o amor. Aliás, desejo mais é que a gente saiba se amar nesse mundo doente.

Música de hoje:

A Violência Travestida Faz Seu Trottoir