Era dia 24 de fevereiro de 2014, domingo, por volta de uma
da tarde, e o céu estava nublado. Lembro que a casa estava em festa, como se
soubesse que a sua chegada traria luz àquele ano infernal. Você representou o
inesperado, desde o primeiro momento que tocou este mundo. Sem nenhuma
precedência de linhagem de cor, você veio negra, pele lisa, fina e brilhante, e
pelos de veludo. Vimos-te rasgar a placenta de sua mãe, sozinha, de olhos
fechados e surpreendentemente caminhar. Ficamos embasbacados, porque você já
havia sido anunciada em sonho. E conforme a música e a alegria de te ver se
tornar real, nós éramos Flamengo, e finalmente tínhamos uma “nêga” chamada
Teresa. Você parecia uma pintura impressionista, de tanta vivacidade de beleza.
Diferente dos outros filhotes, você não ficou com sua mãe canina. Você me
escolheu. Quando eu te peguei, você passou as patinhas perfeitas nos meus
braços e não me soltou mais. Acho que Deus te mandou canina porque eu tinha que
te ter nessa vida, e talvez não possa. Enquanto os outros brigaram, você
manteve a calma de não se envolver em confusão, porque você sabia que era ali
que você deveria ficar. A partir de então, olhar para você era só alegria. Acho
que você tinha um despertador incansável que tiquetaqueava no seu peito sem
parar. Nunca vi criatura com mais vontade de viver. Você era completamente
feliz e ativa por existir neste mundo. Acho que na verdade você sabia que o tique-taque
era um cronômetro, marcando 3 anos, 3 meses e 18 dias. Um, dois, três e já. Ter
você na minha história foi como assistir à passagem de um cometa. Foi intenso demais,
você era minha metade, eu contava os segundos para sorrir com você, e foi muito
rápido. As demasiadas convulsões, injeções, medicamentos, nunca te deixaram
desanimar. Você continuava a caçar, a correr, a brincar e a me fazer carinho.
Tenho que dizer que você era a criatura mais doce também. Por isso, no dia de
sua morte, quando te vi estática, fiquei tremendamente assustada. Eu sabia que
era o fim. Que você tinha atingido seu limite. Vi sua alegria de viver se
transformar em luta para continuar vivendo. E não poderia ser diferente do seu
ritmo. Tudo demorou menos de 24 horas. Rápido e dinâmico, como tudo que você
fazia. E seu último olhar me dizia: mãe, eu não quero ir. O que me arrebenta é
que eu não pude fazer nada. E também que o nosso cubículo é tão grande que não
me cabe mais. Não cabe meu sono, não cabe minha paz. Tem outras coisas que não
entendo também. O porquê do sonho, o porquê de tão rápido, a dor imensa de
perder tanto em tão pouco tempo, do falso milagre que me fez acreditar que Deus
tinha me ouvido dessa vez, a efemeridade da vida. Se já estava complicado,
agora meu coração é um vazio espacial. Tudo tanto faz. E eu morro de saudade
todos os dias, dos seus olhos que sorriam, das suas patinhas abraçando meus
braços, de você comer meu sapato ou o papel higiênico, do seu cheiro de suquinho de uva e das suas lambidas
enxugando minhas lágrimas. E eu que sempre quis ver um cometa, agora posso
dizer que peguei carona na cauda do mais bonito que já existiu.
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