quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

"As guerras são todas tristes, e não tem nada demais."



"Em breve será 11h00. Horário em que a primeira bala foi disparada pelo exército britânico na Primeira Guerra Mundial. Convidamos a todos a se juntarem a nós durante dois minutos de silêncio em respeito à memória daqueles que deram suas vidas por este país."

Imóveis, as pessoas estacionaram-se em todo e qualquer lugar. Absoluto silêncio. E cá estou eu, novamente, no país que protesta por causa de lagostas. Durante estes dois minutos, fiquei pensando na guerra. Acredito que todos os motivos que levam à explosão de uma guerra são estúpidos e poderiam ser facilmente resolvidos com a conversa e o ceder. Depois, pensei que se meu país entrasse em guerra e eu fosse convocada à lutar, só o faria se fosse obrigada.

Mas o que faz um país parar, literalmente, por dois minutos, em memória daqueles que deram sua vida em nome da pátria? Essa pátria que vemos pular nos broches, nas pessoas caladas, na salva de palmas, é um ato diário de amor à identidade que os orgulha. Tenho certeza que várias dessas pessoas que lutaram na I Guerra Mundial não foram por mera obrigação, mas se voluntariaram. Ao partir, certamente sentiram saudade dos que ficaram em casa e também tiveram medo de morrer. Entretanto, creio que a motivação maior, que os fez ir em frente e marchar, foi a ferida aberta causada por aqueles que ameaçavam sua identidade, o ser britânico. A identidade é aquilo que somos. Tudo o mais é passageiro. Mas essa essência, quando ameaçada, nos faz sangrar. 

Hoje, se o Brasil entrasse em uma guerra, eu não iria nem por obrigação. Me sinto sem pátria, estrangeira nas terras canarinhas. Claro, pelos motivos que todos já sabem: corrupção, violência, saúde e educação precárias. É triste pensar que sempre foi assim. Só está mais à mostra agora. Gostaria muito que fosse melhor no futuro. Quem sabe?

Contudo, o que mais desperta em mim o sentimento de não pertencer é ser obrigada a carregar um prédio nas costas diariamente, fingindo ser o que não se é, numa prisão perpétua em si mesmo. Porque o Brasil que condena a liberdade, o negro, o direito humano, a mulher, o velho, o trabalhador, o homo afetivo, a liberdade religiosa, Michelangelo, Rafael, Nietzsche e Cazuza, não me representa. 

Sinceramente fico pensando à respeito do que Deus está achando de nós. É essa hipocrisia que me enoja. Todos os dias surgem mais vídeos, postagens e comentários extremistas que segregam todos nós que somos um só povo. Vozes clamam o retorno de um autoritarismo que torturou e dilacerou famílias inteiras. E eu sou obrigada a me calar, senão....

Então o asco cresce por dentro, tomando conta de tudo, escorrendo pelos olhos, causando hemorragia interna.... tudo que se quer ao acordar é ter algo na mão que dispare uma bala e te proporcione a benção de não existir mais. Não há coisa tão grave que ter de usar uma máscara o tempo todo na penúria de sobreviver mais 24 horas. Ter medo de apanhar, de perder o emprego, de machucarem seu amor. Viver desconfiando de Deus, dos homens e de cada batida de um coração. Porque este Deus pintado por eles está longe de prometer qualquer possibilidade de um futuro de leveza, paz e amor.

Tenho que voltar à minha não pátria daqui uns dias. E o que eu sinto é uma enorme preguiça. Pelo menos, mudando de perspectiva, consegui remover a máscara, respirar fundo e ver o bom rosto de Deus para compreender que eu, seguidora de Gandhi, lutaria uma guerra pelos esquecidos por esta nação.

Pesquisas projetam que 2018 será pior em relação à intolerância com o crescimento de um candidato extremista. Sendo eles a maioria, eles tornam-se esta pátria, que não sou eu. Eu amo o Brasil. Deus foi imensamente generoso com sua riquezas e belezas. Mas desta vez, eu estarei vestindo uma outra farda. Vai ter luta. E quando eu morrer, quero poder dizer que não fui um deles.

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